sábado, 22 de setembro de 2012

Casarões em Santa Rita do Araguaia resgatem história da região

Por Chaiani Rosso

Foto: Chaiani Rosso

Em Santa Rita do Araguaia, a 510 km da capital Goiânia, quatro casarões de modelo colonial chamam a atenção da população e de alguns historiadores. Os locais preservam a história da região, ocupada por garimpeiros e criadores de gado. 

Os quatro casarões, todos de modelo colonial, ainda hoje conservam a maior parte de suas características originais, mesmo depois de um século. Eles estão localizados na Chácara Santa Rita e nas Fazendas Santa Rita, São Bento e Babilônia. 

Além da influência direta na vida de algumas famílias de Santa Rita do Araguaia, os casarões fazem parte do acervo cultural e arquitetônico da região sul do estado de Goiás e contribuíram diretamente para o surgimento das cidades de Santa Rita e Alto Araguaia - MT

Nem sempre Santa Rita do Araguaia teve este nome. O município já foi conhecido como Araguaia, por causa da população que margeava o Rio Araguaia de um lado e do outro, mais tarde sendo conhecida também como Ivapé, que na língua indígena Tupi, significa caminho das frutas. Esse último nome derivou dos enormes pomares que eram notados nos quintais de algumas casas e de algumas fazendas, pomares estes que eram famosos em toda região. 

Mas foi ao redor destes casarões, que eram sedes das fazendas, que começaram a surgir outras construções que posteriormente se tornaram um vilarejo e, logo depois, nas cidades. 

Os casarões coloniais fazem parte do acervo cultural e arquitetônico de Santa Rita do Araguaia. “A história de um povo ela é a raiz dessa sociedade, a sociedade se alimenta culturalmente da história, de como as coisas aconteceram, de como as coisas progrediram e chegaram até o momento”, explica a historiadora Sônia Maria Barros Galvão. 

O filósofo e professor Danilo Persch aponta ainda a importância da memória para uma sociedade. “Tudo o que nós somos hoje é herança de alguma maneira do nosso passado, nós nos construímos dentro dessa história”, destaca. 

O professor explica que um povo sem memória que não conhece passado é um povo perdido. “Se nós não valorizarmos o que os outros fizeram nós também não podemos querer que outros valorizem o que os fizemos” conclui.


Construção da Fazenda Santa Rita preserva traços da arquitetura portuguesa

Foto: Chaiani Rosso

O casarão, localizado na Fazenda Santa Rita, traz consigo além de histórias de construções com modelos diferentes, retratos da religiosidade de uma família tradicional. 

A construção teve início em 1895 por José Manuel Fernandes Salgueiro e Maria Julia Carvalho Vilela Salgueiro. Esse casarão, mais parecido com modelos portugueses, era raro de ser encontrado. O material usado nesse tipo de construção era importado da Europa por um preço alto para os padrões de renda das famílias da época. 

José Manuel vendo a necessidade de ter mantimentos para a venda ou troca na região criou em uma parte do seu casarão o comércio de cima. Nesse tempo, as mercadorias eram trazidas de Buenos Aires até Cuiabá – MT, mas José Manuel achou melhor ele mesmo ir buscar esses mantimentos. A compra era feita anualmente e, enquanto ele viajava para Buenos Aires, Maria Júlia ficava responsável pelos negócios da família. 

Devoção

Pela grande devoção de Maria Julia e de sua família a Santa Rita dos Impossíveis, a esposa pediu ao marido que fosse construído um templo nas terras da família para homenagear a santa. 

A Igreja foi erguida em 1930, por outro José Manuel, um carpinteiro especializado em obras sacras que também colaborou com a construção de igrejas em Santos (SP) e Jataí (GO)

A partir dessa construção, José Manuel se interessou pelas terras na região de Santa Rita, onde decidiu residir e, posteriormente, formar família. 

Outra construção de José Manuel que pode ser encontrada nas terras da Família Salgueiro é uma ponte toda feita em aroeira que liga os estados de Goiás e Mato Grosso

Essa ponte foi construída em 1900, sendo a segunda ponte feita na região. Pelo grande tempo que o carpinteiro ficava dentro da água, para fazer o desvio das águas mais fortes e para perfurar o buraco para por o esteio maior, ele acabou pegando uma pneumonia. José Manuel faleceu em Petrópolis, no Rio de Janeiro, após três anos de tratamento.


Casarão da Fazenda Babilônia teve a primeira sala de aula rural da região 

Foto: Chaiani Rosso
Este casarão foi de Zeca Ferreira, e de acordo com um dos três herdeiros da fazenda, João O terceiro casarão colonial da cidade de Santa Rita do Araguaia (GO) localiza-se na Fazenda Babilônia. É um casarão atípico em Goiás, por ser um dos poucos do estado construído no modelo de dois andares. 

Prudêncio Ferreira afirma que as obras do casarão duraram mais de cinco anos. 

No ano de 2010, o casarão passou por uma reforma, onde os proprietários procuraram manter as formas originais, trazendo o conforto da atualidade, sem alterar os traços antigos. Em um dos cômodos desse casarão foi feita a primeira sala de aula rural, atraindo crianças de vários locais. 

A família Ferreira, há 70 anos, também mantém a tradição de todos os anos comemorarem a Festa de São João. Antes de adquirirem as terras da Fazenda Babilônia, o evento era realizado na antiga fazenda da família.


Casarão foi refúgio em confronto entre Carvalhinho e Morbeck 

Foto: Chaiani Rosso

A Fazenda São Bento abriga também outro casarão importante para a história de Santa Rita do Araguaia. O local não tem uma data certa para sua construção, mas há registros do casarão em citações de cartas da família já em 1905. 

A história que pode ser contada com mais precisão é datada a partir de 1923, quando o casarão foi reformado pelo senhor Joaquim Camarada, que comprou este local e efetuou uma reforma que mantinham as características originais. Ainda hoje o casarão e a Fazenda São Bento são de posse da mesma família que a adquiriu em 1923. 

Mesmo depois de um século a estrutura ainda é preservada, com o mesmo madeiramento, o material usado na construção das paredes, o telhado e até mesmo o calçamento de pedra. Segundo informações do genro de seu Joaquim Camarada, Espírito Santo Ferreira de Andrade, na época da reforma todo material foi trazido até o local com carros de boi, o meio de transporte mais comum desta época. 

O casarão da Fazenda São Bento se mostra de alta relevância para a história dos dois municípios por ser uma das primeiras da região e também por guardar parte da história da guerra conhecida como revolução dos Carvalhinhos e Morbeck, duas famílias que se enfrentaram por interesses políticos e garimpeiros. 

Na época da guerrilha muitas famílias se refugiaram neste casarão, temendo ataques nas cidades. Essa revolução aconteceu por volta de 1920, nas proximidades do Rio Garças e Rio Araguaia.


Primeiro casarão de alvenaria de Santa Rita continua preservado 

Foto: Chaiani Rosso

O primeiro casarão de alvenaria construído no município goiano de Santa Rita do Araguaia foi arquitetado por José Estevão de Melo. A construção foi erguida na propriedade da atual Chácara Santa Rita em 1885, e serviu como sede para exploração do garimpo nos rios da região, especialmente o Rio Araguaia. 

A família do Senhor José Estevão foi a primeira a explorar a região, seguidos posteriormente pela família Salgueiro. Até então a fazenda estendia suas fronteiras até a Serra da Urtiga, a aproximadamente 35 km do atual centro da cidade. 

A atual área do território do município goiano se deve a doação de terras do senhor José Manoel Vilela e sua esposa Leocádia Perpétua de Silvéria, fazendeiros e residentes em Jataí – GO. Os dois mil hectares de terra doados foram responsáveis pela formação do patrimônio de Santa Rita do Araguaia. A doação não foi por acaso. A região era cobiçada pelo potencial econômico voltado ao garimpo e a bovinocultura. 

A história apresentada por descendentes da família conta que a casa ainda foi construída com o auxílio de escravos. As telhas do casarão, que perduram ao tempo e ainda hoje podem ser encontradas no galpão da casa, foram feitas nas coxas dos escravos, tornando-as irregulares, umas maiores que as outras. 

Fato interessante é que o ditado popular “feito nas coxas”, para expressar algo que não está bom, irregular e sem padrão surgiu justamente pelo fato de no período colonial as telhas das construções em sua maioria serem feitas nas cochas, sem um molde perfeito, os que as tornavam irregulares e disformes.


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